sábado, 17 de fevereiro de 2018

Tuiuti, um case de escola


Postado em 15 de fevereiro de 2018  por Juremir Publicado em Uncategorized
 Nada mais clássico do que o tema da manipulação pela mídia. A resposta padrão a essa acusação recorrente é: teoria da conspiração. Volta e meia, porém, a chamada mídia convencional resolve provar que tem culpa no cartório. A televisão vem sangrando por causa das redes sociais e das novas tecnologias. A geração Netflix não quer saber de tevê tradicional. A perda de audiência é um fantasma que apavora os até agora donos da imagem, do poder, do imaginário e do que vemos. Apesar disso, a velha televisão não para de cometer antigos erros como tentar esconder a realidade do telespectador. O desfile da Paraíso do Tuiuti, do Rio de Janeiro, é o que se chama de “caso de escola”.
Como se diz para ficar mais impactante, um “case” para monografias, dissertações e teses de doutorado. A Tuiuti detonou Michel Temer, representado como “vampirão neoliberalista”, e o seu governo. A televisão fez tudo para esconder o desfile. A Rede Globo não teve como encobrir as imagens ao vivo, mas os apresentadores da casa pagaram mico com longos silêncios constrangedores. No dia seguinte, os telejornais trataram de editar a passagem da escola resumindo-a a um lacônico “fez críticas sociais e políticas”. Enquanto isso, na internet, a ironia comia solta. A reforma trabalhista de Temer foi comparada a um retorno à escravidão. Silêncio quase total na primeira hora.
As piadas nas redes sociais moeram a mídia. A Tuiuti zombou dos chamados paneleiros coxinhas, aqueles que ajudaram a derrubar Dilma Rousseff e depois sumiram, e de todas as instituições atoladas em suas contradições. O tom do humor foi este: MBL vai à justiça por escola de samba sem partido; MPF denuncia Tuiuti como pertencendo aos filhos de Lula; viu o vampirão na televisão? Não, ele atravessou o samba e foi cortado. Um fiasco. É assim que a televisão perde credibilidade. Arrogante, pensando estar nos seus tempos de soberania absoluta, ela só queria diminuir o “estrago” protegendo o governo do ridículo da sua própria trajetória e do desvendamento da sua existência tragicômica.
A repercussão do desfile da Tuiuti foi internacional. Na Europa, jornais falaram do inusitado: uma escola de samba denunciando ao vivo e em ritmo frenético de samba um “golpe de Estado” e criticando as reformas impopulares de um governo chamado de ilegítimo. Como dizem os franceses, “du jamais vu”. Algo nunca visto antes. Um jornal francês descreveu o que os telejornais brasileiros ignoraram: “Paraíso da Tuiuti fez o presidente Michel Temer, acusado de corrupção, desfilar como Drácula. Sobre um monte de dinheiro, o mais impopular dos presidentes brasileiros desde o fim da ditadura (1985) foi representado com cédulas coladas sobre penas de pavão”. Esses detalhes não chamaram a atenção de nossos minuciosos comentaristas. Que coisa! O pessoal de vez em quando cochila. Uau!
Agora sempre que alguém perguntar “a mídia manipula mesmo?”, a resposta será: “Claro, óbvio”. Diante do tradicional, “mas não é teoria da conspiração?”, a resposta será: “Basta ver o que fizeram com a Tuiuti”. O tempo em que as coisas só existiam se passassem na tevê acabou. A televisão ainda não sabe disso. A Globo tentou se recuperar com 48 horas de atraso. Está melhorando. Antes ela levava 50 anos.
A Tuiuti foi vice. Mas o seu vice é Michel Temer, aquele que é sem nunca ter sido.
A Beija-Flor ganhou com o seu pior desfile.
Um case de escola de samba não será esquecido.
Dá tese.
– Juremir Machado da Silva – Correio do Povo – 15fev18

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