sexta-feira, 11 de maio de 2012

DECISÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO

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Institucional - Carlos Insaurriaga - Sex 11.05.2012 - 15h59 - Assessoria de Imprensa | Fotógrafo
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DECISÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO

Decisão na íntegra
Agravo de Instrumento
Décima Segunda Câmara Cível
Nº 70048692768 Comarca de Porto Alegre

Grêmio Esportivo Brasil   AGRAVANTE
Confederação Brasileira de Futebol   AGRAVADO
Superior Tribunal de Justiça Desportiva   AGRAVADO
Federação Gaúcha de Futebol   AGRAVADO

DECISÃO
Vistos.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por GRÊMIO ESPORTIVO BRASIL em face da decisão interlocutória proferida no âmbito da ação de rito ordinário com pedido de antecipação dos efeitos da tutela ajuizada em desfavor de CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA DESPORTIVA e FEDERAÇÃO GAÚCHA DE FUTEBOL, que assim dispôs, verbis:
“(...) Da análise dos documentos juntados aos autos, bem como dos argumentos constantes da exordial, entendo não emergir a prova inequívoca da verossimilhança do direito almejado pela parte autora, no que se refere ao seu pedido de reinclusão no Campeonado Brasileiro da Série C.
Por primeiro, ressalta-se que, não obstante a argumentação do demandante, não se pode afirmar, por ora, que os direitos do atleta Cláudio Roberto Siqueira Fernandes Filho foram suprimidos no processo que determinou sua suspensão por um jogo. Em verdade, o único fato passível de averiguação neste momento processual é o de que o clube autor somente buscou informações atinentes às condições de jogo do referido atleta depois da realização da partida de 22 de julho de 2010.
Ou seja, por este viés, se afigura inviável, agora, o reconhecimento de eventual irregularidade no dito processo disciplinar, já que indisponíveis as informações necessárias.
Por segundo, ressalta-se o fato de que o jogador, funcionário do clube, tinha conhecimento de sua expulsão no último jogo do campeonato nacional do ano anterior, sendo, ao mesmo, previsível a possibilidade da existência de óbice à sua atuação na partida subsequente.
Desta forma, muito embora se verifique a existência do perigo de dano de complexa reparação no caso em tela, não se infere verossimilhança do direito alegado pelo demandante.
Contudo, no que diz respeito ao pedido de que seja determinado às demandadas CBF e FGF que não procedam na sua desfiliação por conta da utilização da Justiça Comum, entendo ser viável a concessão da tutela, tendo em vista a impossibilidade de se negar acesso ao Poder Judiciário aos interessados, nos casos em que há o visível esgotamento da Justiça Desportiva, consoante dispõe o § 1º do artigo 217 da Constituição Federal.
Isso posto, DEFIRO parcialmente a antecipação de tutela pleiteada, para determinar que as demandadas se abstenham de desfiliar o clube autor de seus quadros por conta da discussão proposta neste feito. (...)”. GENECI RIBEIRO DE CAMPOS, Juíza de Direito.
Em suas razões recursais, o agravante suscitou, em suma, a urgência da medida, pois o seu indeferimento significaria o perecimento do direito reclamado. Discorreu sobre o processo que culminou na punição disciplinar ao atleta, repercutindo na agremiação autora, que viu retirados pontos e, com isso, sofreu o rebaixamento de divisão no futebol nacional. Alegou ter agido de boa-fé, sendo que, se erro houve em seu procedimento, ele deve ser atribuído aos réus. Advogou a possibilidade de intervenção judicial para reparar o ilícito de que se viu vítima.

É o relatório resumido.
Eis os fatos, pelo acervo documental trazido com o agravo de instrumento. O jogador de futebol Claudio Roberto Siqueira Fernandes Filho, enquanto atleta do Ituiutaba Esporte Clube/MG, recebeu cartão vermelho em partida realizada contra o ABC/RN, na data de20.11.2010. O respectivo jogo era válido pela última rodada da Série C do Campeonato Brasileiro daquele ano. Em razão dessa expulsão (e do posterior julgamento do atleta perante o STJD, que o suspendeu por uma partida), originou-se a presente celeuma, já que, na visão daquela Corte Desportiva, o atleta, quando contratado pelo Grêmio Esportivo Brasil/RS, não poderia ter atuado na partida de estreia do Campeonato Brasileiro da Série C de 2011 por este clube, porquanto deveria ter cumprido a respectiva suspensão. Daí a perda de pontos pelo clube recorrente – definida em outro processo perante o STJD – e o consequente rebaixamento para a Série D daquele certame.
Eis a situação contratual do atleta: vínculo encerrado com o Ituiutaba Esporte Clube/MG em 21.11.2010 (um dia após a partida na qual foi expulso); em 13.01.2011, transferido para o América Futebol Clube/SP, cujo contrato restou rescindido em 23.02.2011; após, no dia 03.03.2011, contratado pelo Esporte Clube Democrata/MG, relação encerrada em 02.06.2011; daí, então, adveio a contratação do atleta pelo ora recorrente, Grêmio Esportivo Brasil/RS, cuja transferência se efetivou em 13.07.2011, ut histórico acostado à fl. 164.
Nesse contexto, observo que o responsável pelo Departamento de Registro da Federação Gaúcha de Futebol prestou a seguinte declaração: Declaramos para os devidos fins, que o Setor de Registro e Transferência de Atletas da Federação Gaúcha de Futebol não foi comunicado pela Federação Mineira de Futebol, das punições sofridas pelo atleta Claudio Roberto Siqueira Fernandes Filho (146354), quando da transferência para o GE Brasil, de Pelotas. E, por ser expressão da verdade, firmamos a presente.Tal documento data de 14.09.2011; e reporta-se, de fato, à data da transferência do jogador para o clube recorrente (fl. 160).
Portanto, embora a notificação da FGF seja posterior ao jogo que implicou a perda dos pontos, pelo recorrente, em função da utilização do jogador, certo é que o seu teor dá conta que, à data da transferência, ou seja, em 13.07.2011 (data pretérita à realização da partida, por óbvio), não havia qualquer notícia advinda da FMF sobre alguma restrição na utilização do atleta naquele jogo. De modo que o fato de ter, ou não, o agravante buscado informação anterior junto à FGF se mostra, aqui, indiferente em termos práticos, já que, definitivamente, o teor da resposta seria o mesmo.
Aliás, importante ressaltar que, no documento da fl. 162, cópia de Telefax encaminhado pela Confederação Brasileira de Futebol, consta o seguinte comunicado: Em atenção à consulta formulada com os Ofícios nºs. 020 e 34/2011, cumpre-nos esclarecer que adotando o sistema da FIFA, as transferências de jogadores punidos são concedidas, sendo informado ao clube de destino a punição que deva ser cumprida (...) – sublinhei. E este documento, que é datado de 14.03.2011, deve ser interpretado em conjunto com aqueles das fls. 259 e 261.
É dizer, à fl. 259 do instrumento, há cópia do “BID CLUBE – BRASIL/RS – RELAÇÃO DE HOMENS”, documento no qual consta o nome do jogador, coincidindo o respectivo número da inscrição (n. 146354) com aquele constante na declaração da Federação Gaúcha de Futebol (fl. 160), que dava conta da inexistência de punições sofridas pelo atleta. No mesmo sentido, o DURT – Documento Único de Registro e Transferência da fl. 261, em que o nome do jogador, com o mesmo número de inscrição, se encontra na situação “Ativo”. Tudo a tornar, ao menos, verossímil a tese do recorrente, notadamente tendo em vista o teor do documento acostado à fl. 161, formulário no qual, expressamente, no campo relativo à Transferência, o atleta dispõe que não tem Suspensão Disciplinar a ser cumprida.
Ora, a primeira e importante conclusão dos fatos é a de que o clube recorrente agiu mesmo de boa-fé ao escalar o atleta Claudio Roberto Siqueira Fernandes Filho no jogo de estreia da série C do Campeonato Brasileiro de 2011. É que a Federação Gaúcha de Futebol – FGF, instada, informou ao agravante, mesmo após a partida, que inexistiria qualquer restrição/punição dirigida àquele atleta quando da transferência para o clube. Na mesma linha, a Confederação Brasileira de Futebol – CBF, embora assumindo a responsabilidade em informar ao clube de destino eventual punição a ser cumprida pelos jogadores transferidos, nada nesse sentido teria disposto em seus registros. Pelo contrário, incluiu o nome do atleta no BID e no DURT, caracterizando a condição do atleta como ativo. Assumindo, com a sua postura – como já o fez em situações pretéritas similares (fls. 463-466) –, sua parcela de responsabilidade pela utilização do atleta.
E não há como taxar de negligente a conduta do clube, o qual, embora em data posterior àquele jogo, efetivou troca de e-mailsjunto aos responsáveis pelos registros de punições disciplinares, na tentativa de ratificar as informações que teria recebido anteriormente a respeito da ausência de punição ao jogador.
Nesse sentido, foram acostadas cópias de e-mails (fls. 262-263), datados de 22.07.2011, enviados, ao que tudo indica, para a Federação Mineira de Futebol – FMF (destinatário mg.registro), com as seguintes redações: Prezado Olavo, Confirmando informação do Sr. Claudio (TJD/MG), relativa ao Atleta Claudio, transferido de seu filiado Democrata/GV para o Grêmio Esportivo Brasil, solicitamos que, apenas por cautela, seja formalmente ratificado comunicado acerca da inexistência de punição disciplinar referente ao jogador. Atenciosamente (...); Boa Tarde Olavo, Estamos no aguardo da resposta do email enviado anteriormente (...)– sublinhei. Há cópia de e-mails, também, sobre eventuais punições de distintos jogadores, os quais tiveram a solicitação da conversão da pena de suspensão em pagamento de cestas básicas deferidas, ut fls. 265-276.
De qualquer modo, tal constatação se presta tão somente a confirmar, de um lado, a já referida boa-fé do clube agravante por ocasião da utilização do jogador na partida de futebol impugnada; e, de outro, a verdadeira desorganização administrativa da entidade materdo futebol brasileiro. E, por mais absurdo que possa parecer, até aí temos erros grosseiros de procedimentos, aceitos pela Justiça Desportiva, ao efeito de exonerar qualquer responsabilidade à CBF, FMF, FGF, ou aos clubes anteriores que detiveram o vínculo do atleta. Lançando, por um critério míope de justiça, tudo ao encargo do agravante.
Além dos documentos já citados, trouxe o agravante, ao presente instrumento, cópias do Código Brasileiro de Justiça Desportiva e do Regulamento Geral de Competições da Confederação Brasileira de Futebol, sustentando que o art. 70[1]deste entraria em confronto com o § 1º[2]do art. 171 daquele. E a definição aqui, embora o absurdo do procedimento, fica nos limites da autonomia de interpretação que se confere à entidade organizadora da competição.
Significa dizer se os clubes aceitam esta desordem, a falta de critério ou o flagrante abuso de poder, tudo ainda está dentro da chamada autonomia de gestão, matéria interna corporis, sobre a qual não cabe a intervenção judicial.
Entretanto, o caso presente ultrapassa aos desmandos, à desordem, à autonomia, indo além, desenhando o quadro da ilegalidade.
Explico.
Dos elementos constantes no presente instrumento, observo que houve mesmo o esgotamento das vias administrativas pela parte agravante, em atendimento ao que dispõe o art. 217, § 1º[3], da Constituição da República.
Partindo dessa premissa, saliento, em primeiro lugar, que a interferência do Judiciário, quando provocado, em eventuais questões ligadas à Justiça Desportiva, como a presente, não tem o condão de enveredar para controvérsias ligadas à autonomia da respectiva entidade, quanto à sua organização e funcionamento.
A competência do Judiciário, em verdade, limita-se a apreciar alguma afronta ao ordenamento jurídico eventualmente perpetrada pela Justiça do Desporto. E, na hipótese, a ilegalidade ocorrida seria a suposta ausência de citação do atleta (contratado pelo recorrente) no âmbito do processo, julgado no Superior Tribunal de Justiça Desportiva, que o suspendeu por 1 (um) jogo em decorrência do cartão vermelho que lhe teria sido apresentado em partida válida pelo Campeonato Brasileiro da Série C. Fato que teria inviabilizado a prática comum de conversão da pena em medida social, além de acarretar a draconiana penalidade a terceiro – no caso o agravante – por suposto descumprimento da decisão alegadamente nula.
De acordo com a versão da parte autora, ele – o atleta - não teria sido notificado a respeito da existência do processo, tampouco sobre o seu resultado final. E, acaso verídicas as alegações da parte, estar-se-ia diante de clara afronta à ordem constitucional, mais precisamente aos princípios da ampla defesa e contraditório, fato que ensejaria o deferimento da pretensão.
Passo, pois, à análise deste ponto.
Compulsando o presente instrumento, percebo que foi acostada cópia integral do processo no qual restou aplicada a pena de suspensão de 1 (um) jogo ao atleta, ut fls. 383-410.
No que interessa ao caso concreto, após a apresentação da denúncia ao STJD, os autos foram conclusos ao Auditor Presidentee, no mesmo dia, 01.12.2010, ao Dr. Procurador, conforme certidão da fl. 396. Em 04.12.2010, retornados os autos ao Auditor Presidente, este nomeou relator, o Dr. Otacílio Araújo, designando para o dia 14.12.2010 a sessão de instrução e julgamento.
Na sequência, em 09.12.2010, foram notificados da data aprazada para o julgamento, via fax, a Federação Mineira de Futebol(fl. 398) e o Ituiutaba Esporte Clube/MG (fl. 399).
O processo, então, foi julgado pela 2ª Comissão Disciplinar do STJD, conforme se verifica da certidão da fl. 400, cujo resultado foi o seguinte: “Por unanimidade de votos, suspender por 01 partida, Claudio Roberto Siqueira Fernandes Filho, atleta, por infração do Art. 250 do CBJD e suspender por 01 partida, Valdonedo da Silva Xavier, técnico, por infração do Art. 258 do CBJD, ambos do Ituiutaba EC”. O Ituiutaba EC, não apresentou defesa.” [negritei].
O julgamento é datado de 14.12.2011. E cópia do resultado foi encaminhada, também via fax, desta vez apenas para a Federação Mineira de Futebol, como se vê da fl. 402.
Encerrando-se, assim, o processo.
Percebe-se, pois, que o atleta, base da punição, ao contrário do que veio a ser referido na decisão judicial recorrida, em momento algum foi notificado a respeito da existência ou do julgamento daquele processo. A numeração contínua do caderno processual assim permite concluir.
Do que consta dos autos, sobre a denúncia apresentada, foram cientificados o Ituiutaba Esporte Clube/MG e a Federação Mineira de Futebol. Mas o jogador já não mais mantinha qualquer vínculo junto ao Ituiutaba naquela dada. E tão só a FMF restou notificada acerca do resultado final do julgamento.
Todavia, mesmo notificada, teria – a FMF - deixado de comunicar à FGF sobre a punição – como já salientado.
Após encerrado o julgamento no âmbito daquele processo no qual o atleta restou punido, já em 16.09.2011, um dia após o julgamento final do outro processo, que gerou a retirada de pontos do Grêmio Esportivo Brasil (fl. 364), foi juntado aos autos do processo promovido contra o atleta pedido de conversão da pena de suspensão em medida de interesse social (fl. 411), ocasião em que, aí sim, pôde o jogador se manifestar naquele feito, discorrendo sobre as mesmas alegações ora deduzidas (nulidade do processo, falta de intimação e de citação).
O pleito, todavia, restou indeferido de forma flagrantemente abusiva, tendo a decisão de indeferimento da fl. 427 acolhido integralmente o parecer das fls. 39-41 dos autos originários, as quais correspondem às fls. 424-426 deste instrumento. No ponto, vale citar o teor daquele parecer, verbis:
“(...) Trata-se de requerimento do atleta Claudio Roberto Siqueira Fernandes, que foi punido pela 2ª. CD deste STJD com 1 partida de suspensão, por infração ao art. 250 do CBJD, em 14 de dezembro de 2010, alegando que o processo desportivo está eivado de nulidade, por não ter sido o citado atleta regularmente citado nos autos, pois já teria se desvinculado do Ituiutaba no momento da intimação.
Em primeiro lugar, o pedido de anulação do processo foi feito de forma irregular, pois trata-se de caso de Revisão, para o qual deveria ser apurada a existência de custas, a seguir o rito próprio.
De toda a forma, mesmo que se admitisse tal pedido, o mesmo veio desprovido de qualquer prova, infringindo o art. 115 do CBJD.
“Art. 115. A revisão só pode ser pedida pelo prejudicado, que deverá formulá-la em petição escrita, desde logo instruída com as provas que as justifiquem, nos termos do art. 112.”
Analisando os autos, se demonstra que o atleta não fez qualquer prova efetiva e direta do vício de citação, nem sequer juntou cópias das provas produzidas nos autos do processo 89/2011, no qual o Brasil de Pelotas perdeu pontos pela atuação irregular deste atleta.
Portanto, a nulidade de processo deve ser cabalmente provada, incumbindo a parte produzir tal prova, o que não ocorreu.
Por fim, o atleta foi denunciado no art. 250, tendo pego a pena mínima de uma partida, não havendo nenhum motivo concreto para a conversão da pena, nos termos do § 1º do art. 172 do CBJD, primeiro por impossível fracionar uma partida, e também por se tratar de pena branda de fácil cumprimento.
Abrir tal precedente permitiria que todos os atletas punidos com uma partida requeressem a conversão, sem base e justificativa nenhuma, ressaltando a obrigação de cumprimento da suspensão automática, a qual, em tese, não pode ser afastada por este STJD.
Por todo o exposto e pelo que mais consta nos autos, é a presente manifestação para se determinar o arquivamento dos autos, mantendo-se a decisão da 2ª CD.”
Da leitura do parecer, chama a atenção, em primeiro lugar, a justificativa final de que o atleta teria pego a pena mínima de uma partida, não havendo nenhum motivo concreto para a conversão da pena.

Com efeito, causa estranheza o fato de que um jogador, punido com pena mínima, não possa obter a conversão da pena em medida de interesse social, enquanto outros, que obtiveram sanções mais severas, possam se valer da benesse. Tal raciocínio, a meu ver, inverteria a lógica da norma.
Entretanto, também aí, trata-se de questão que desborda da competência deste signatário, já que não representa afronta à lei, mas, sim, relaciona-se com o mérito do julgado.
Donde descabem maiores considerações, salvo a inequívoca afirmação do absurdo procedimento, para dizer o mínimo.
Em verdade, no ponto que interessa ao caso, consigno que o não acolhimento da pretensão deduzida pelo atleta se deu ao argumento de que este não teria feito prova cabal daquilo que alegou. Pretendia o Auditor Presidente, ao que parece, que o atleta fizesse prova de que não teria sido notificado/citado do julgamento do processo no qual restou punido.
Ocorre que se trataria de produção de prova negativa, de difícil ou impossível realização. Daí porque denominada de prova diabólica. Aqui, permito-me ressaltar que, também ao clube recorrente, na ocasião em que julgado pela utilização supostamente indevida do atleta, veio a ser requerida a produção de prova negativa no sentido de que restassem comprovadas as alegações de que nem o clube, tampouco o jogador, tivessem ciência da punição anterior, ut decisão da fl. 363.
Exigências que se mostraram de todo descabidas. Nesse sentido, o seguinte precedente do STJ:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEÇA OBRIGATÓRIA. CERTIDÃO DE INTIMAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. FORMALISMO EXCESSIVO. PROVA DIABÓLICA. MEIO DIVERSO DE VERIFICAÇÃO DA TEMPESTIVIDADE. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE.
1 - Em homenagem ao princípio da instrumentalidade, a ausência da certidão de intimação da decisão agravada pode ser suprida por outro instrumento hábil a comprovar a tempestividade do agravo de instrumento.
2 - Exigir dos agravados a prova de fato negativo (a inexistência de intimação da decisão recorrida) equivale a prescrever a produção de prova diabólica, de dificílima produção. Diante da afirmação de que os agravados somente foram intimados acerca da decisão originalmente recorrida com o recebimento da notificação extrajudicial, caberia aos agravantes a demonstração do contrário.
3 - Dentro do contexto dos deveres de cooperação e de lealdade processuais, é perfeitamente razoável assumir que a notificação remetida por uma das partes à outra, em atenção à determinação judicial e nos termos da Lei 6.015/73, supre a intimação de que trata o art. 525, I, do CPC.
Agravo a que se nega provimento.
(AgRg no AgRg no REsp 1187970/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/08/2010, DJe 16/08/2010)
Na sequência, no âmbito do processo movido contra o atleta, após o indeferimento do seu pedido, o jogador interpôs recurso, o qual não foi conhecido quanto ao pedido de conversão, e, em relação à alegação de nulidade, foi desprovido, ut fls. 454-457.

A decisão final, vale salientar, data de 20.03.2012.
Eis a razão por que, a associação agravante ajuizou a demanda apenas agora, no jargão do futebol, no apagar das luzes.
Diante do contexto narrado, tudo leva a crer que o atleta, quando do julgamento do processo que lhe rendeu a suspensão de uma partida pelo STJD, não teria tido mesmo a oportunidade de se defender daquilo pelo que estava sendo julgado, fato que, por certo, ofende os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa insculpidos no inciso LV do art. 5º da Constituição da República, aplicáveis, também, à Justiça Desportiva, conforme se vê do seguinte precedente deste Tribunal, verbis:
MANDADO DE SEGURANÇA. FUTEBOL AMADOR. SUSPENSÃO DE ATLETA. SEM DIREITO A DEFESA. OFENSA A PRECEITO CONSTITUCIONAL. PRELIMINAR. ENTIDADE SEM PERSONALIDADE JURÍDICA, REPRESENTADA EM JUÍZO PELA PRESIDÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. OS PROCESSOS DE NATUREZA DESPORTIVA ESTÃO SUJEITOS AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. A PRIMAZIA DA JUSTIÇA DESPORTIVA NÃO EXCLUI DA APRECIAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO, EM ÚLTIMA INSTÂNCIA, OS FATOS E AS INFRAÇÕES DISCIPLINARES RELACIONADOS COM O DESPORTO AMADOR OU PROFISSIONAL (CF, DE 1988, ART. 217, §§. 1º E 2º). EXCLUSÃO DA HONORÁRIA ADVOCATÍCIA. REFORMA PARCIAL, EM REEXAME. (Reexame Necessário Nº 590028494, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Celeste Vicente Rovani, Julgado em 05/06/1990) [grifei]
Tampouco teria sido notificado o jogador a respeito do resultado dos julgamentos, a impossibilitar eventual irresignação sua contra as decisões proferidas pela Corte Desportiva. O que impediria o atleta, ainda, de comunicar a respectiva punição aos clubes em que, no futuro, viesse a atuar.

Aliás, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva, no seu Capítulo V, que trata da Comunicação dos Atos, ao tratar da citação e da intimação, menciona, no art. 47, que estas deveriam ser feitas por edital instalado em local de fácil acesso localizado na sede do órgão judicante e no sítio eletrônico da respectiva entidade de administração do desporto. E o seu § 1º estabelece que, além da publicação do edital, a citação e a intimação deverão ser realizadas por telegrama, fac-símile ou ofício, dirigido à entidade a que o destinatário estiver vinculado.
Mas, do que consta do processo ajuizado contra o atleta, não há qualquer indício de que a citação teria se efetivado por meio de edital ou algum outro meio passível de comprovação (§ 2º). Mesmo após o desarquivamento do feito, a pedido do jogador, quando alegada a nulidade por ausência de citação, eventual citação/intimação por edital sequer restou cogitada.
Preferindo a Corte Desportiva incumbir o ônus da prova negativa ao atleta.
E o fato de o jogador ter ciência da expulsão não implica, por si só, negligência ou má-fé de sua parte ou das agremiações que o contrataram posteriormente.
É que o CBJD, no § 1º do art. 171, não necessariamente impõe a suspensão por partida como pena nos casos de expulsão no último jogo do campeonato, com consequente sanção estabelecida pelo STJD.
A pena muito bem poderia – como o foi em relação a terceiros jogadores do clube recorrente (fls. 268-270) – ter sido convertida em medida de interesse social. Aí, o irreparável e definitivo prejuízo ao agravante – Grêmio Esportivo Brasil.
A verdade é que, como afirma o recorrente, a Confederação Brasileira de Futebol, provavelmente tomando como paradigma o presente caso envolvendo o Grêmio Esportivo Brasil/RS, percebendo a fragilidade do seu sistema habitual de pesquisa acerca da condição de jogo dos atletas em decorrência do recebimento de eventuais cartões, que, na maioria dos casos, se dava via contato telefônico, tomou a iniciativa de, sugestivamente apenas um dia depois da última decisão proferida no processo que retirou os pontos do clube recorrente (fl. 382), em 22.09.2011, adotar um sistema informatizado de consulta, por meio do qual o próprio clube interessado poderia acessar diariamente o sistema SGD – Sistema de Gerenciamento de Dados, o qual incluiria a posição dos jogadores perante eventuais penalidades aplicadas pelo STJD (suspensão por jogos). O sistema teria sido utilizado pela confederação, de forma experimental, do dia 03.10.2011 até o dia 30.11.11.
Tais informações, saliento, foram retiradas do Ofício DCO – 236/11 da CBF, cujo teor tive acesso por meio do sítio eletrônico da própria confederação[4], confirmadas, nos autos, pelas reportagens anexadas pelo recorrente (fls. 189-190).
E causa mesmo estranheza que não tenham sido mencionadas, em momento algum, no âmbito dos processos envolvendo tanto o jogador (quando do pedido de conversão da pena em medida de interesse social) quanto o Grêmio Esportivo Brasil/RS.
Em suma, não há como deixar de considerar, diante do conjunto de elementos narrados: a) que o clube recorrente estaria mesmo de boa-fé quando da utilização do atleta na partida de estreia da Série C do Campeonato Brasileiro de 2011. E, naquilo em que lhe foi possível efetuar busca de informações, obteve apenas respostas evasivas, de que não haveria restrição sobre punições disciplinares ao jogador; b) a evidente ilegalidade cometida pelas entidades agravadas, que, ao arrepio de princípios constitucionais, ultimaram por penalizar o clube agravante com perda de pontos e consequente rebaixamento de divisão no futebol nacional.
Não ignoro que se deve evitar definições interventoras no âmbito desportivo.
Sobre o tema, extraio da lição de Rodolfo Camargo Mancuso: "Não é difícil perceber que as reiteradas intervenções jurisdicionais nas controvérsias desportivas, mormente no âmbito do futebol, parece que mais acirram os ânimos, do que os aplacam. Ademais, indispõem entre si ambas instituições, contribuindo, ainda, para o desprestígio da Justiça Desportiva perante os clubes, atletas, entidades e associações, empregando um caráter de 'transitoriedade' às decisões desportivas. Por fim, essa interação enseja que juízes togados vejam-se envolvidos em certos episódios tumultuosos e popularescos nem sempre compatíveis com a respeitabilidade da toga" ("A inafastabilidade do controle jurisdicional e suas exceções – estudo quanto à aplicação do tema à justiça desportiva no âmbito do futebol, in Revista de Processo, nº 31, p. 54).
Idem a lição de Álvaro Melo Filho, para quem "há um evidente despreparo do Judiciário para o trato das questões jurídico-desportivas, que exigem dos julgadores o conhecimento e a vivência de normas, práticas e técnicas desportivas a que, normalmente, não estão familiarizados, criando, desse modo, um perigo extraordinário em termos de denegação de justiça, pois há peculiaridades na codificação desportiva compreendidas e explicadas somente por quem milita nos desportos. Vale dizer, não será possível definir direito e aplicar justiça em função de matéria desportiva fora do mundo do desporto, sem o espírito da verdade desportiva, sem o sentimento da razão desportiva. Aquele que decidir questão originária do desporto, imbuído do pensamento formalizado nas leis gerais, terá distraído a consciência da justiça" (in Revista de Processo, nº 54, p. 154).
As lições doutrinárias estão encartadas em precedente julgado pelo STJ, nos autos de ação civil pública, na qual se buscava incluir a SER Caxias na séria “A” do campeonato brasileiro de 2002 (Medida Cautelar 5.240 – RN, na qual figura a CBF como requerente, e requerido ABC Futebol Clube, sendo relator o Ministro Edson Vidigal).
Todavia, antecipo que o caso nada tem de similar.
Naquele episódio, graçavam liminares dos diversos rincões do País, concedidas por diversos juízes de primeira instância, acarretando séria ameaça de tornar inviável a competição. E, portanto, o que ali se pretendeu resguardar, com êxito, é a autonomia da entidade desportiva de gerir os eventos por si patrocinados.
Aqui, após ultrapassadas todas as instâncias da justiça desportiva, em atenção ao que dispõe o art. 217, I, da CF, bem assim o art. 52, parágrafo 2º. da Lei 9.615/98, define-se, em caráter liminar, que o efeito desportivo produzido sobre a associação agravante – Grêmio Esportivo Brasil – não foi validamente produzido no âmbito dos tribunais desportivos.
Sobre a possibilidade de intervenção judicial, manifestou-se o Supremo Tribunal Federal, valendo citar:
No que tange à autonomia das entidades desportivas, ao direito de livre associação e à não intervenção estatal, rememorou-se o entendimento da Corte segundo o qual nenhum direito, garantia ou prerrogativa ostentaria caráter absoluto. Em seguida, afirmou-se que a disposição sobre a autonomia das associações não teria caráter absoluto em nenhuma circunstância. Verificou-se que se deveria conceber o esporte como direito individual, não se afigurando viável interpretar o caput do art. 217 da CF — que consagra textualmente o direito de cada um ao esporte — à margem e com abstração de seu inciso I, onde constaria a autonomia das entidades desportivas. Sublinhou-se que, na medida em que definido e compreendido como objeto de direito do cidadão, o esporte emergiria, com nitidez, na condição de bem jurídico protegido pelo ordenamento, que se sujeitaria àquele primado do direito individual ao esporte. Dessumiu-se que seria imprescindível ter-se em conta, na análise das cláusulas impugnadas, a legitimidade da imposição de limitações à autonomia desportiva como exigência do prestígio e garantia do direito ao desporto, constitucionalmente reconhecido. Registrou-se que o diploma adversado homenagearia, entre outras coisas, o direito do cidadão à vida, à integridade e à incolumidade física e moral, inerentes à dignidade da pessoa humana, à defesa de sua condição de consumidor, ao lazer e à segurança. Clarificou-se que os preceitos contestados teriam por objetivo evitar ou pelo menos reduzir, em frequência e intensidade, episódios e incidentes como brigas em estádios, violência, morte e barbárie entre torcidas. Situação que, decerto, seria mais caótica e preocupante se o diploma não estivesse em vigor. No que concerne ao alegado desrespeito a direitos e a garantias individuais, anotou-se que não se vislumbraria sequer vestígio de ofensa aos incisos X (intimidade, honra, imagem dos dirigentes), LIV (devido processo legal), LV (contraditório e ampla defesa), LVII (proibição de prévia consideração de culpabilidade) e § 2º do art. 5º da CF. No tocante ao devido processo legal, evidenciou-se, também, que estaria textualmente invocado no art. 37, caput, do Estatuto. (ADI 2937/DF, rel. MIn. Cezar Peluso, julgado em 23.02.2012). Os destaques são nossos.
E não se pretende dizer como a CBF vai organizar a competição, mas referir que o resultado do campo desportivo foi ilegalmente modificado por decisão arbitrária, que poderá ter reflexos dramáticos à associação agravante.
O signatário é amante do futebol. Frequenta estádios há mais de 50 anos. E, como todo desportista, abomina o chamadotapetão, no jargão do futebol. O futebol é esporte, cultura de um povo. Significa educação. E, como tal, não é terra sem lei, sendo intolerável o arbítrio.
Aliás, diz o Estatuto do Torcedor, aplicável ao caso:
Art. 10. É direito do torcedor que a participação das entidades de prática desportiva em competições organizadas pelas entidades de que trata o art. 5o seja exclusivamente em virtude de critério técnico previamente definido.
§ 1o Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de colocação obtida em competição anterior.
Seria, rigorosamente, o caso do Grêmio Esportivo Brasil. Pela disputa desportiva, pelo procedimento pautado pela boa-fé, não poderia ser penalizado, salvo um procedimento ilícito, que ultimaria por alijá-lo da convivência na divisão nacional em que estava incluído por mérito desportivo.
Na linguagem do futebol, teria sido o tapetão – eivado de ilegalidade ¬– que rebaixou o agravante.
A intervenção judicial liminar se impõe para recobrar o mérito esportivo e espancar a ilegalidade. Demonstrado, pois, a verossimilhança do pedido.
Como o início do Campeonato Brasileiro da Série C deste ano estaria agendado para o próximo dia 27, a manutenção da decisão hostilizada poderia implicar perecimento do direito invocado, pois, após iniciada a competição, seria impossível o ingresso do recorrente durante o seu curso.
A gravidade do dano a ser gerado para o recorrente no campo desportivo residiria no fato de que, de um total de 40 (quarenta) clubes, apenas os 4 (quatro) melhores colocados no Campeonato Brasileiro da série D ascenderiam à C do certame a ser disputado no ano seguinte, cujos demais disputantes seriam excluídos automaticamente da competição nacional, em qualquer série, dependendo a reinclusão da obtenção de vaga no campeonato regional da primeira divisão, não estando habilitado para tanto o recorrente, em função de disputar atualmente o campeonato da segunda divisão regional. E, ainda, a não concessão da tutela antecipada lhe geraria prejuízos financeiros evidentes, porquanto não receberia as verbas destinadas aos clubes participantes da terceira divisão do certame nacional.
DISPOSITIVO.
1.Com base no disposto pelo art. 461, parágrafo 3º. do CPC, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente, quando razoáveis os fundamentos do pedido, razão por que defiro a pretensão da associação agravante, que pugna por comando judicial aos requeridos no sentido do cumprimento de obrigação de fazer, consistente na sua imediata inclusão no certame nacional da série “C”.
É, nesse sentido, a definição liminar.
2.Na efetivação da tutela específica – inclusão na série “C” – o juiz, a requerimento da parte ou mesmo de ofício, poderá impor multa por dia de atraso no descumprimento da decisão. Assim, com base no permissivo do art. 461, parágrafo 5º, do mesmo dispositivo legal, fixo, de forma solidária a todos os réus,a multa diária por descumprimento em valor equivalente a R$ 100 mil (cem mil reais).
3.Reconheço a autonomia da CBF na organização de seus campeonatos. E, pelas exigências do Estatuto do Torcedor – art. 5º, parágrafo 1º, II, redação dada pela Lei n° 12.299/2010, poderá, eventualmente, a definição liminar ser de impossível provimento para o presente campeonato.
Em havendo obstáculo intransponível na imediata inclusão da agravante no certame de 2012, sinalizo, desde logo, com a possível conversão futura da obrigação – art. 461, § 1º, do CPC – em perdas e danos, em valor a ser estimado em eventual sentença de procedência, observada a limitação no valor de R$ 36 milhões (trinta e seis milhões de reais), o equivalente a um ano de atraso no cumprimento da obrigação, pela perda da oportunidade de disputar a atual competição. Antecipo, ainda, que a eventual ineficácia imediata da medida não significa perda do seu objeto, porque, via reflexa, poderá ser forma de assegurar o provimento judicial buscado para o certame de 2013, com a almejada inclusão do Grêmio Esportivo Brasil no certame nacional da série C.
4.Assim, concedo o efeito suspensivo ativo, nos termos das disposições supra, com base na regra do art. 527, III, do CPC.
5.Oficie-se ao juízo de origem.
6.Intimem-se os agravados, para, querendo, oferecerem contrarrazões no prazo legal (endereços constantes à fl. 23 do instrumento).

Porto Alegre, 04 de maio de 2012.
Des. José Aquino Flôres de Camargo,
Relator.



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