sexta-feira, 17 de abril de 2015

Sexta-feira

Sono perdido, paixão viva, angústia, esperança, luta à vista. Como definir isto que sinto agora? Esta algazarra vibrando em meu cérebro? Um coração aloprado anunciando o maior desafio da Nação Xavante? Como sou pequeno diante dessa emoção que começa a estraçalhar-me. Chorar? Por quê? Se tantas alegrias vivi em teu seio Caldeirão de Amor. Povão cantando. Xaranga tocando. Desordem numa ordem só: torcer, torcer, torcer e torcer. É isto! Torcer, torcer, torcer e torcer. O que mais sabe fazer um Torcedor Xavante a não ser torcer, torcer, torcer e torcer? Está aí o motivo dessa vida? Torcer, torcer, torcer e torcer?

Como vou encarar o ruído desses tijolos tombando? Mais uma vez, só me resta torcer, torcer, torcer e torcer. Sexta-feira. Sono perdido, paixão viva, angústia, esperança, luta à vista. Quatro e quarenta da madruga. Cadê o sol? Por que tarda em chegar? O que está reservado a mim a não ser torcer, torcer, torcer e torcer?

Sei que não é a primeira vez que tamanha transformação acontece nesse Caldeirão de Amor, mas como um parto, é sempre uma nova luz, uma nova esperança, uma nova vida. Hoje eu tremo e treme a Torcida Xavante. Mas amanhã, coitados dos adversários, verão a transformação do Estádio mais humano num colossal conquistador de vitórias. O que dirá Ruy Carlos Ostermann e toda a imprensa nacional?

Sono perdido, paixão viva, angústia, esperança, luta à vista. E tudo começou em 1939 com um terreno comprado por 12.000$000 (doze mil contos de réis) divididos em sessenta quotas de 200$000. Integralizaram essas cotas Benjamin Vasquez Gonzalez, José Gomes Tavares, Adolfo Aranalde, Mário Orlandi, Bento Mendes de Freitas, Joaquim Valente da Costa, Valentim Costa, Francisco dos Anjos Filho, Manoel Ayres Junior, Bernardo Trápaga, Álvaro da Assumpção Faria, Hormindo José Ayres, Luiz Schuch, Gustavo Teixeira de Souza, Frederico Zambrano Sequeira, Cyro da Silva Tavares, Frederico Otto Schuch, Oswaldo Fetter, Francisco da Silva Martins, Joaquim Oliveira & Cia. Ltda., Mário Sacco & Cia. Ltda., Soares, Gomes & Cia., Café Nacional Soc. Anônima, Adriano Lopes Rochedo, Francisco Lopes Rochedo, Francisco Turnes Oureiro, Francisco Louzada de Brito e Amâncio Louzada de Brito. Além das quotas, os participantes colaboraram com uma contribuição complementar para o início do Estádio. Tiveram ainda a feliz ideia de fazer a doação da área ao Clube gravada com cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade fazendo assim com que o G. E. Brasil nunca perca o seu Estádio, perpetuando-se no tempo suas gloriosas atividades. (Do livro de Carlos Marino Louzada – Lembranças que Lembram).

Sono perdido, paixão viva, angústia, esperança, luta à vista. Há tanto a lembrar nessa hora derradeira. E, claro, aquele Bra-Pel de 1977 não poderia ficar de fora. “O Torino é nosso! O Torino é nosso! O Torino é nosso!” gritava a Torcida Xavante desesperademente na mais perfeita oração que já se entoou na Baixada. Um pênalti; uma vida; uma conquista nacional; uma grande transformação a partir da marca do cal. Uma festa a cada tijolo conquistado no dia-a-dia dos Rubro-Negros até o majestoso jogo contra o Flamengo com a presença de mais de vinte mil pessoas no Bento Freitas multiplicado num piscar de olhos. Tudo feito às pressas. Um esforço monstruoso. Centavo a centavo em listas garranchadas de paixão. De certo que traria consequências. Mas tinha que ser justamente contra um novo Flamengo? Já não tinha mais Zico. Zagallo fora engolido. Mas o presente foi cruel. Um espelho tombou. Interdição. Um placar adverso.

Bento Mendes de Freitas e sua turma devem estar em pé de guerra. Ricardo Fonseca também. Ainda bem. Sexta-feira, sono perdido, paixão viva, angústia, esperança, luta à vista...






 Foto: Carlos Insaurriaga





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